As grandes produtoras tentam se salvar investindo praticamente só em sequências, personagens conhecidos e fórmulas manjadas. Mas a história deixa claro: isso é um tiro no pé.
E agora um vilão com mais de 30 anos de tela vai voltar das
cinzas – ou da Estrela da Morte: Darth Vader. E pelas mãos do Mickey Mouse.
Porque a Disney acaba de fechar um negócio das galáxias, comprando a Lucasfilm
– a produtora de George Lucas – por US$ 4 bilhões. A nova dona da marca Star
Wars não perdeu tempo em anunciar mais uma trilogia, para 2015. É outra aposta
à prova de azar de uma empresa que não quer saber de riscos, investindo em
marcas que já chegam ao cinema com um público formado – as outras foram a Pixar
e a Marvel.
Natural: as franquias são uma aposta segura. Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge
alcançou US$ 447 milhões nas bilheterias americanas. Os Vingadores, então, US$ 623 milhões. Para efeito de comparação, o
último filme do Woody Allen – Para Roma,
com Amor – fez US$ 16 milhões. Na primeira semana de exibição, de cada US$
3 gastos com ingresso para cinema nos EUA, um ia para o filme com os heróis da
Marvel. A tendência é clara: os faz fazem fila para ver personagens que já conhecem.
Caso contrário, preferem ficar em casa com suas TVs de Led.
Por conta disso, as produtoras decidiram colocar todos os
ovos na cesta das franquias. Em 2008, por exemplo, a Warner fechou duas
subsidiárias especializadas em filmes independentes – a Warner Independent
Pictures e a Picturehouse – alegando foco no “custo x benefício”. A própria
Disney, que tinha comprado a indie Miramax em 1993, repassou-a em 2010 para o
Filmyard Holdings, um grupo de investimentos. Naquele mesmo ano, outra
independente famosa, a Weinstein Company, só se salvou do buraco porque vendeu
os direitos de mais de 200 de seus títulos para o grupo Goldman Sachs.
Esse eterno retorno às sequências pode parecer bom no
momento para os cofres das produtoras, mas acaba sendo ruim para o cinema – e
sobrando para o lado delas também. A falta de renovação, afinal, enfraquece a própria
vontade do espectador de sair da sua casa, pagar estacionamento e pipoca para
ver mais do mesmo. Ou seja: até os blockbusters acabam sofrendo o baque. Nos EUA,
a bilheteria de 2012 foi a pior desde 1995. Com Batman e tudo.
No fim das contas, abdicar da renovação sai caro para a indústria.
Nos anos 70, foi um grupo de jovens criativos e ousados que tirou da lama o
cinema americano – então num poço sem fundo por conta da concorrência da TV e
do conservadorismo dos estúdios, que não acompanhavam a revolução
comportamental da época. A venda de ingressos, que em 1946 tinha atingido seu
auge histórico de US$ 78,2 milhões por semana, despencou para US$ 15,8 milhões
em 1971. Esses jovens, veja bem, eram Steven Spielberg, Francis Ford Coppola,
Martin Scorsese... e o próprio George Lucas. Eles romperam com a tradição e se
arriscaram em filmes “de autor”, à moda europeia, nos quais o estilo do diretor
tem de estar acima dos patrões do estúdio. Optaram muitas vezes por atores
pouco conhecidos, personagens anti-heróis e tramas sem final feliz. Acertaram na
Mega Sena. O principal ingrediente da nova formula era justamente a independência
(em relação ao que o estúdio imaginava que fosse dar certo). Se os produtores
ficassem com a última palavra, o baixinho Al Pacino, por exemplo, não passaria
do primeiro ensaio para O Poderoso Chefão.
Coppola teve de bater o pé e se fingir de surdo para manter seu Michael
Corleone.
Mas, no começo dos 70, os estúdios estavam tão desnorteados
com a crise que toparam deixar responsabilidade para aqueles hippies com câmera
na mão. Resultado: Taxi Driver
(Scorsese), Tubarão (Spielberg), além
do próprio Chefão – e de Star Wars. Filmes que não tinham nada a
ver com a fórmula hollywoodiana dos anos 50 e 60. O público adorou. As bilheterias
venderam horrores, e os estúdios foram salvos. Justamente porque contrariaram
as próprias regras.
Os estúdios podem usar números recentes para alegar rejeição
do público à criatividade. Vencedores do Oscar como O Artista (filme P&B e mudo) e Guerra ao Terror (que desbancou Avatar
na premiação) fizeram sucesso com a crítica, mas se deram mal nas bilheterias. Só
que, olhando só por esse lado, os produtores talvez estejam sofrendo da mesma
amnésia do filme de Nolan. Porque a geração dos 70 mostrou que a liberdade
criativa não serve apenas para revelar gênios do cinema: ela também é ótima
vendedora de ingressos e de pipoca.
(Alexandre Carvalho dos Santos - O fim da criatividade em Hollywood; Sessão Essencial, Superinteressante; Dezembro, 2012; páginas 24 e 25)
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